Em um dos diálogos do filme nacional “Pequeno Dicionário Amoroso”, a personagem de Daniel Dantas, em um dos diálogos com seu novo, promissor e inspirado amor (resumindo: efêmero!), na tentativa de convencimento sobre a falida instituição do casamento, diz que o certo, como juramento no altar, seria não “que até a morte nos separe”, mas sim “que até o tédio nos separe”. Esse “até a morte nos separe”, enfatize a dimensão eterna do amor, imóvel e inesgotável. Isto é, Mito! Já a alternativa sugerida pela personagem do Daniel Dantas, “até que o tédio nos separe”, enfatiza a dimensão pós-moderna do amor, objeto descartável que não sobrevive ao desgaste, ao uso, como aparelhinho de orgasmo inutilizado após o motor pifar ou acabar a energia das bateriazinhas não recarregáveis. Mas acredito, que essa perspectiva atual do amor, pós moderno, do “até que o tédio nos separe”, não fica muito distante de um Mito, talvez a outra face da moeda, assim como a dimensão eterna do amor.
A culinária contemporânea não está comprometida com a necessidade fisiológica da alimentação, e sua função vital. Essa culinária pressupõe o aniquilamento da função biológica da digestão, elevando o processo do paladar à categoria da mais fina arte. Ninguém come. Agora, degusta! Comida não existe para encher barriga. Comida existe para incrementar, com habilidade de artesão, os temperos da libido. Em nenhuma época, a comida esteve mais associada ao ato de saborear o corpo do outro, volúpia canibalística, do que hoje. Comer e ser comido, puro êxtase! “Um a-mais” perdido nas digestões que nutrem a carne mas insatisfazem o corpo libidinoso. Ao comer, saboreamos as assinaturas dos grande chefs. Ao comer, conhecemos culturas impossíveis de serem desbravadas, mesmo se viajássemos até lá. Ao comer, percorremos mapas, compomos feitiços, aprofundamos sentimentos. Então, é dos quitutes e iguarias que o homem menos precisa para sobreviver. Pôs é só dos quitutes e iguarias, supérfluo, que o homem deleita um erotismo inútil socialmente, mas fruição indispensável da libido que o faz, tão somente, homem!
Esqueci de acrescentar uma curiosidade, talvez esclarecedora… A raiz da palavra “saber”, vem da palavra “sabor”. Às vezes, não conseguimos perceber o óbvio ululante. Nietzsche diz, apoiado em Spinoza, que o conhecimento é a mais alegre potencialidade do existir. E alegria, não corresponde à felicidade, muito pelo contrário. Podemos chorar, infelizes, e mesmo assim estarmos alegres. A angústia, quando não paralisa, faz da experiência de vazio, uma possibilidade de criação, de reinvenção, e isso é alegria. Voltando com Nietzsche… Ele fala que o herói niilista, cai no abismo chorando. E o herói trágico, alegre, cai no abismo rodopiando, dançando. Então, saber é sabor. Sabor é saber. O saber não se reduz a uma atividade mercantil, que consome o homem. O saber saboreia o homem, e é saboreado por este.
escrito por Alex Azevedo
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