Ela destrancou a porta. Ele girou a maçaneta. Entrou... Haviam marcado aquele encontro às escuras. Ela pouco havia conversado com ele antes de se verem. Não sabia o suficiente sobre seu caráter – se é que seja possível saber algum dia. Queria convidá-lo para se sentar num elegante sofá reservado apenas para ocasiões especiais. Não era só uma peça decorativa, pois, outrora, memoráveis momentos de supremo êxtase ficaram impressos em seu estofado. Aquela seria uma grande possibilidade de recomeço. Entorpecente promessa de vivenciar idílios inomináveis. O anonimato, afetação em raso mergulho, sem o ônus dos sentimentos, era fórmula ideal e infalível para chafurdar no melado pecaminoso.
Tinha absoluta certeza que a noite seria inesquecível. Depois de tanto tempo sendo usado somente em solitárias divagações, o aconchegante sofá iria novamente ser palco de coreografias dionisíacas. Corpos engalfinhados. Capilares enroscados. Artérias latejantes. Vasos contraídos. Olhos de sedentos felinos.
Tentou estender os braços para cumprimentá-lo. Um tremor ósseo manteve seus braços dobrados, cotovelos colados ao corpo. Não compreendeu tal reação. Paralisou-se por repentino medo que lhe reprimiu a gana erótica. O homem esbelto à sua frente implorava com lábios dóceis, que ela o domesticasse entre suas coxas umedecidas pelo gozo silencioso da transpiração. A língua estalando no céu da boca antevia a sucção esponjosa de primata amordaçado. Superfície dilacerada por enfurecidas carícias e dóceis arranhões. Invulgar semblante a comprimir e a liberar viscosas trocas fluídicas.
Ele continuou lá, parado, em frente a ela todo o tempo. Talvez esperando que ela o cumprimentasse e o convidasse para se sentar. Ela permaneceu extática perante aquele macho exalando testosterona pelos poros dilatados. Estava um pouco enferrujada – não negava, mesmo com certa resistência -, mas ainda conseguia farejar a distâncias inimagináveis o odor de um animal no cio. O másculo tronco exibido pela camisa de botão aberta. Peito desnudo. Imagem satânica que a excitava ardentemente. Provocava contorções íntimas em seu ventre. Desejos obscuros e mundanos, clamando pela realização pulsante das viscosas seivas corporais, foram suscitados. Jamais afastaria aquela tentação beatífica. Plumas vigorosas a deslizar pelas reentrâncias salivares, transbordando em cenários de arrepios vibrantes.
Lá estava ele, esperando. Ela, com o cataclismo das expectativas, não mexia nem os cílios e sobrancelhas. Seu braço continuou travado, grudado ao corpo tenso. O suor já não era quente de prazer. Era um suor frio de pavor. Rígida como uma estatueta, coroava a si própria pela estupidez da inércia e falta de traquejo pessoal. Não moveu nenhum músculo. Seu Adônis, beleza exótica, incomum, manteve-se ali, esboçando leve sorriso de timidez e constrangimento. Ambos não trocaram nenhuma palavra. Ela, no instante em que o braço descolou do corpo, pôde estender finalmente as mãos. Mas num ato de inquietante espontaneidade, empurrou o galã porta afora, e com a outra mão, fechou a porta com toda a força que seu corpo franzino poderia imprimir em tal gesto.
Calmamente, ela se virou, deixando a porta trancada para trás – assim como a trava de seu corpo –, e colocou de lado a funda borda do frustrante esquecimento. Chegou perto do seu sofá, reservado para as ocasiões especiais, alisou a beiradinha do estofado e se jogou nos braços do seu amado móvel com aquela suave espuminha de poliuretano e delicado revestimento de chenille. Estirada no sofá, curtindo a árida solidão – mas sem culpa por ter desprezado o bonitão -, acendeu um cigarro, pegou uma sexy e sofisticada taça de vinho e se preparou, recostando-se confortavelmente, para assistir a um espetacular filminho ao estilo água-com-açúcar que suas amigas sempre lhe recomendaram.
ESCRITO por ALEX AZEVEDO DIAS.
30 comentários:
Bom,nossa esse texto é super detalhadisimo.
Bom msm
Muito bem organizado. Só não se torna um conto erótico por causa da forte presença de palavras "científicas" e falta de palavras da norma coloquial. Me enganou direitinho e o final foi broxante, kaoskoaskoa.
Bem... A intenção era essa! rs...
Detalhado, surpreendente, mas acima de tudo muito bem escrito, bom vocabulário.
Você deu uma de "Clarice Lispector. Uma tmpestade em um copa d'água rsrs, mas foi uma boa história rsrs...
Alex, seu conto está bem rebuscado. No entanto, acho que você abusou muito das palavras 'científicas’ e isso me deixou um pouco confusa. O comentário acima citou Clarice, bem, não creio tanto. Pois apesar de ter lido, não senti. Apesar de que você possui um grande vocabulário, que na minha opinião, poderia ser mais explorado e um tanto mais ousado. Um pouco de Bukowski. Não sei. Ou Rubem Fonseca. Prefiro o linguajar deles para falar de sexo. Apesar de tudo, parabéns pelo blog e desculpe pelo meu comentário diferenciado dos outros.
olá Alex,
Vc. retratou a alma feminina: instabilidade. Sinceramente, eu esperava esse desfecho. As mulheres mudam de opinião rapidamente.
Bem... Apesar de ter escolhido esse título para o meu conto "Sexo", ele não é sobre sexo. Ou não exatamente sobre o tipo de sexo que alguns leitores podem esperar. Compreendam, talvez, com uma certa "ironia". Abraços...
Gostei bastante da desconstrução do título através do texto em si. As palavras mais rebuscadas creio que foram escolhidas justamente para ajudar na desconstrução irônica e tirar o tom Bukowskiano que o título - e a expectativa ante a ele - remete. Achei bastante interessante no texto a inversão de ápices físico/psicológico. Onde o momento crucial esperado seria o de movimento de entrega da personagem, mas acabou sendo o sentimento de zelo pelo objeto e pelo momento solitário da mesma. Muito bom.
http://realidadeexperimental.blogspot.com
supreendente, muito bem escrito.
Parabéns
Só mais um coisa, ótima gramatica.
Se eu disser que dá pra sentir o que vc escreve, que vc escreve muito bem, que adorei o texto estarei sendo repetitiva visto que muitos dizem o mesmo, massss é a verdade, adoreiiiiiii. vou até te seguir, depois passa la no meu cantinho http://deliciasdabota.blogspot.com/
Achei muito bom, nas primeiras linhas e pelo titulo, tudo remete à um conto erótico e aos poucos percebe-se que o objetivo do conto não é excitar...
bastante criativo, abraços
http://www.vacavadia.blog.br
faltou sexo! rs
Sim, sexo é falta! rs...
isso é quase vicio e falta junto
o cara tava tenso
aehaehae
e a mulher tbm
Achei muito bom como conseguiu detalhar no seu texto.. vai conduzindo e arrasa no final!
;D
Muito bomm o texto .. lembrei de nosso amigo Freud quando larga "Afinal, o que querem as mulheres?" Rs.. Adoreeeiiii
Visita meu blog depois, tem muitas novidades .. www.essencialhumano.blogspot.com
sexo é bom de mais..
rsrs
http://www.novaquahog.com/2011/03/vida-de-uma-vagina.html
Bem escrito, elaborado e finalizado.
Adorei! Você escreve super bem. Podia pensar em se tornar escritor de verdade. Acho importante quando o escritor se preocupar em nos fazer entender tão minuciosamente os sentimentos dos personagens. Assim ahistória fica mais profunda, nos prende mais e se torna mais interessante.
Parabéns!!!!
amigo, tu és genial em teus textos. tens alguma coisa, algum livro publicado?
e ai meu amigo de blogosfera !
Esse texto,no minimo provocador me pareceu na verdade a transparencia da personagem quanto a ironia de seu afeto ao outro...o sexo na verdade seria uma ferramenta e não o objeto central do texto...
inevitavelmente broxar continua sendo um pecado tanto no universo masculino quanto no feminino...mas a verdade é :
elas não estão nem ai !!!!
http://universovonserran.blogspot.com
atualizei !
As mulheres querem saber o que elas querem...
ótimo texto... vc ganha seu leitor nos detalhes... parabéns...
Muito bom esse seu texto, soube escolher as palavras certas :)
simplismente adorei seu texto..palavras muito bem colocadas...um conto erótico inteligente..rs
O final é interessante...como já uma pessoa acima,vc lembra um pouco Clarisse,detalhando muitas coisas de poucos momentos...se vc escrevesse um livro ele teria umas mil páginas!Parabens!
http://juventudeinformada.blogspot.com/
Usar de 'palavras científicas' (como mencionado em um comentário) e vasto vocabulário não é pra qualquer um.
O paradoxo entre as escolhas foi supremo: poder dar vazão a um prazer repentino e, mesmo assim, optar pela rotineira solidão que faz feliz. Fenomenal! Muitas pessoas agem exatamente dessa form (seja por opção mesmo ou por receios) e não se dão conta disso.
Adorei, Alex!
...faltou o sexo pra finalizar... OU iniciar.
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